Questões de Química no Restauro e na Conservação
Entrevista com o Professor Maurizio Coladonato, publicada originalmente em Il Giornale del Restauro e del Recupero dell’Arte [1].
O Professor Maurizio Coladonato, docente de ‘Química aplicada ao restauro’, ‘Química dos polímeros e dos adesivos’, ‘Normas de segurança’ e ‘Materiais e métodos para experimentação’, nos cursos de Alta Formação do Istituto Superiore per la Conservazione ed il Restauro, sediado em Roma (ISCR, ex-ICR), conta aos nossos leitores a importância da química e de uma abordagem científica ao restauro e à conservação da obra de arte.
Para que serve a Química no setor da Conservação e do Restauro?
Os alunos do primeiro ano do curso de Restauro da Scuola di Alta Formazione dell’ISCR, assim como das outras, não saberiam responder a esta pergunta e, talvez, tampouco saberiam formulá-la. Eles têm uma primeira resposta – sempre inesperada e de qualquer modo formativa – durante as minhas aulas sobre o ‘risco químico’ [2], que precedem qualquer outro tópico relacionado à Química. Bem, ainda que as aulas acabassem com o tópico do risco químico, este tema já seria significativo, ainda que não estivesse exaurido: o conhecimento e a consciência a respeito dos efeitos sobre a saúde da manipulação das substâncias químicas, as modalidades de contaminação toxicológica [3] e os procedimentos individuais e ambientais para enfrentá-las – além dos instrumentos técnicos como o ‘TriSolv’ [4] e os ‘métodos aquosos’ [5] – não limitam o interesse pelas outras disciplinas de química que os alunos irão assistir no curso de Restauro e que abrangem a conservação dos bens culturais.
Quais são as diferentes utilizações da Química no setor do restauro?
Não são apenas para fins de diagnóstico, mas estruturadas durante todo o percurso de uma intervenção de restauro – sobre artefatos móveis ou arquitetônicos – e são relativas aos conhecimentos e à caracterização dos materiais constitutivos e das técnicas de execução das obras de arte, das causas e dos efeitos da degradação e das substâncias de alteração, relativas às escolhas e ao controle dos materiais utilizados nas intervenções e das metodologias de aplicação. A química é um instrumento que pode acompanhar os restauradores nas suas escolhas de projeto, hoje ainda mais importantes devido à introdução, cada vez maior no mercado, de novos produtos sintéticos usados nas fases de limpeza biológica e química, de consolidação e de proteção. Por fim: “Os limites e as vantagens de qualquer instrumento são inerentes a ele, mas dependem, acima de tudo, da ‘sabedoria’ que se obtém com a experimentação atrelada ao conhecimento teórico” [6].
“Hoje é indispensável que os jovem restauradores possam desenvolver, além da sensibilidade artística que, sem dúvida, como é tradição, já os distingue, também uma postura científica mais atual em relação ao restauro, entendida principalmente como aquisição teórico-experimental dos parâmetros fundamentais para um controle ‘técnico’ dos materiais e das operações conservativas, com o fim de assegurar um nível de intervenção que não seja confiado exclusivamente à sensibilidade estética subjetiva” [7].
A química pode, enfim, ser um dos percursos para “continuar pelo caminho da conscientização que se alcança continuando a ‘aprender e aprender’”[8], porque “o conhecimento e a paixão são os ‘instrumentos’ que salvaguardam o operador e os bens submetidos a intervenções conservativas” [9].
Isso significa que todos os restauradores devem ser químicos?
Não, o convite é para cuidar de aspectos – mesmo que não sejam simples de enfrentar – que possam tornar o nosso trabalho e talvez nós mesmos melhores.
Notas
[1] http://www.ilgiornaledelrestauro.it/restauro-conservazione-questioni-di-chimica/
[2] Com relação aos materiais em uso no restauro devem ser lembrados, além do risco toxicológico, a inflamabilidade, a volatilidade e a reatividade, entre outros. Cf: COLADONATO, M. Il restauro visto da vicino. Roma: La Sapienza, 2004.
[3] Cf. COLADONATO, M. Il rischiochimiconel laboratório e nelcantieredi restauro. Lezionidel Corso di Alta Formazione ICR per Restauratori, novembre 2008. Disponível em:
<http://www.iscr.beniculturali.it/documenti/allegati/RISCHIO%20CHIMICO%20NEL%20RESTAURO.pdf> Acesso em 13/06/2017.
[4] COLADONATO, M; SCARPITTI, P.Note sul TriangoloInterattivo dei Solventi e delleSolubilità©. IstitutoSuperiore per La Conservazioneedil Restauro. Disponível em: <http://www.iscr.beniculturali.it/flash/progetti/TriSolv/dati/IT/TriSolv_IT.pdf> Acesso em 13/06/17.
[5] COLADONATO, M. Approcciometodologico per una chimicaapplicataal restauro sostenibile. In: Lostatodell’Arte 14 – Accademia Di Belle ArtidiL’Aquila. L’Aquila 20/22 ottobre 2016. Firenze: Nardini, 2017.
[6] COLADONATO, M; SCARPITTI, P.op. cit.
[7] COLADONATO, M. Convenciónen Roma: losjóvenes y larestauración, 2016. Disponível em: <http://conversaonline.wixsite.com/conversa/coladonato> Acesso em 13/06/17.
[8] Kopp, S. B. Se incontriilBuddha per stradauccidilo. Roma: Casa EditriceAstrolabio, 1975, p. 167.
[9] Ver nota 6.
Maurizio Coladonato é docente de ‘Química aplicada ao restauro’, ‘Química dos polímeros e dos adesivos’, ‘Normas de segurança’ e ‘Materiais e métodos para experimentação’ nos cursos de Alta Formazione do ISCR (ex-ICR); é docente com contrato de ‘Química para o restauro’ e ‘Técnicas e tecnologias de diagnóstico 1’ em Academias de Belas Artes e Universidades italianas (Roma, Bolonha, Frosinone, L’Aquila, Nápoles, Urbino, Viterbo), além de atuar como docente em instituições e universidades estrangeiras (Bolívia, Egito, Malta, Sérvia, Espanha, China, Romênia, Argentina etc). No ISCR, desenvolveu linhas de pesquisa para o estudo de materiais e métodos para a limpeza – com particular atenção ao restauro eco-sustentável –, propondo, experimentando e publicando novos métodos com baixa ou nenhuma toxicidade para a remoção de substâncias orgânicas e inorgânicas das superfícies das obras de arte, como o Triangolo interativo dei solventi e delle solubilità© (Triângulo interativo dos solventes e das solubilidades), e a metodologia para remoção de concreções de carbonatos por meio de soluções aquosas de CO2 (www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1876619613000107), que levaram a pedidos de consultoria – algumas em andamento – por parte de instituições públicas e privadas para a aquisição de metodologias inovadoras com baixo impacto ambiental e baixo risco para operadores e artefatos.
Tradução de Carlo Pagani.
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